Quarta-feira, 27 de Fevereiro de 2008

Agnosticismos, lochs e highlands

Há imensos argumentos a favor e contra a existência de Deus. Não faço ideia de qual será o mais correcto, se é que há algum correcto. Há já algum tempo que tenho a impressão de que o assunto é indecidível. Por muitos Agostinhos, Aquinas, Leibnizs, Humes, Kants, Nietches e Dawkins que por aí apareçam, não há forma de dizer se Deus existe ou não recorrendo a argumentação racional, pois isso seria o mesmo que dizer que as propriedades de um ser absoluto poderiam ser escrutinadas e questionadas por seres menos que absolutos, o que é ridículo. Mas enfim, vá-se lá saber.

 

Há contudo alguns argumentos famosos que de tempos a tempos vêm “à baila”. Um deles é o Argumento do Desígnio, com o qual os profissionais da argumentação, pró ou contra a existência de Deus, perdem milhares de horas. O argumento diz basicamente que a perfeição, a organização e a forma de ser das coisas em geral indicam a presença de um engenheiro (para variar a metáfora do arquitecto) inteligente todo-poderoso que tivesse criado o mundo e disposto a coisas de uma determinada maneira para que pudessem existir e “funcionar” como as vemos existir e “funcionar”. Mas o Hume (o malandro!) e outros tipos inteligentes encontraram imensas falhas neste argumento, ao ponto de os crentes em Deus (com dois dedos de testa) deixarem de o usar. Mais tarde veio o Kant e apresentou (lá pró meio, fim da Critica da Faculdade de Julgar) um argumento a favor de um "talvez... ” Este argumento não é tão conhecido e não é tão atacado porque Kant, outro tipo espertalhaço, teve o cuidado de falar pouco em Deus dessa feita. Grosso modo, ele só disse que a forma como as coisas estão dispostas, e principalmente a forma como conseguimos perceber a sua perfeição e beleza, são bons indicadores que a natureza funciona “como se” tivesse sido desenhada para conseguirmos perceber essa perfeição e essa beleza. Este argumento, também conhecido por Argumento Teleológico, é menos atacado que o Argumento do desígnio porque os Anti-Deus, ou os agnósticos como eu, não têm por onde lhe pegar. Afinal, que é isso de a Natureza ser como é de forma a podermos perceber nela a beleza e a perfeição? Como falsificar essa hipótese? É difícil, senão mesmo impossível.

 

Kant tinha razão numa coisa. Há em nós uma espécie de sentimento do “como se” de cada vez que nos concentramos numa propriedade sublime da natureza ou das coisas que dela fazem parte. Certos cenários são belos ou sublimes ao ponto de nos esmagarem a razão. Não podemos “saltar” daí para a existência de Deus, mas podemos sentir o “como se” entranhar-se nos nossos ossos, carne e alma. Esse foi o “fardo” que tive de "suportar" recentemente quando me deparei com os incríveis "Lochs" e as Highlands (as Terras Altas) da Escócia. Bem sei que foi um processo natural que formou aquelas imensas e majestosas montanhas cobertas de neve no topo, bem como os majestosos lagos. Bem sei que não posso inferir daí o que quer que seja, excepto, talvez, que há forças poderosas a operar na natureza. Mas foi “como se”, lá Isso foi. 

Fala-se por vezes de experiências religiosas. Diz-se “Vi isto ou vi aquilo. É pá, foi divino!” Não me atrevo a ir tão longe. Digo apenas que me senti “como se...”, e estou um bocadinho menos agnóstico. Mas isto passa-me da próxima vez que ouvir falar de assassinos, violadores, pedófilos e catástrofes naturais (mal moral e mal natural) nas notícias.

Estou: abismado
Sonoro: Love will tear us apart - Joy Division
Filosofado por No mercy às 21:40
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